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segunda-feira, 17 de junho de 2013

A Revolta dos Vinte Centavos: o que é e o que deveria ser

Nos últimos dias, dezenas de milhares de manifestantes foram às ruas nas principais cidades do Brasil para protestar. Eu não vou perder tempo repisando o óbvio direito dessas pessoas à livre-manifestação nem fazer o também óbvio repúdio à ação de uma minoria de vândalos presentes nos eventos, ou aos abusos cometidos pelas forças policiais (especialmente as de São Paulo).


Vou me deter na pergunta mais relevante: contra o que exatamente eles estão protestando? O movimento começou com uma reinvidicação clara: a reversão do aumento das passagens em São Paulo (e, implicitamente, uma política de transporte público visando aos interesses da população e não mais obedecendo ao lobby de empresários). Mas, subitamente, algo ocorreu e as pessoas estavam protestando contra a Copa, a Rede Globo, a corrupção, altos impostos, violência nas grandes cidades, pouco investimento em educação, PEC 37, desrespeito aos índios, destruição da Amazônia e, se procurarmos bem, não duvido que encontremos no meio da manifestação até mesmo placas pela libertação do povo palestino.

O fato é que o movimento perdeu completamente o foco, tendo se tornado somente uma expressão vaga de repúdio contra todos os problemas do Brasil. Eu até compreendo (e em parte compartilho) dessa indignação, mas essa moçada idealista, desejosa de mudar o Brasil, realmente acha que uma marcha sem propostas concretas realmente vai acrescentar alguma coisa ao país? Alguém realmente acha que expressar publicamente sua raiva com a corrupção exerce algum tipo real de pressão sobre nossos governantes para o fim da corrupção? A única verdadeira consequência dessas manifestações (além de um vago sentimento de heroísmo naqueles participando das marchas) é a apropriação do mesmo por grupos políticos (notadamente a Direita) para seus próprios objetivos.

E nem vou mencionar a infantilidade dos que se acham "revolucionários" mas apenas apoiam a destruição geral de todo o Sistema (mesmo sem ter nada melhor para colocar no lugar).



O entristecedor é que movimentação popular é exatamente o que mais precisamos neste momento. Não importa quanto qualquer governante tente. A reforma política verdadeira, incluindo uma necessária democratização dos meios de comunicação, só acontecerá quando o povo for pras ruas. O financiamento público de campanhas (condição necessária, mas não suficiente, para que o político eleito seja subserviente ao eleitor, e não àqueles que financiaram sua campanha), só acontecerá quando o povo for pras ruas. Se tivessem ocorrido manifestações como a de hoje contra o novo Código Florestal, este não teria sido aprovado. Nem a CPI do Cachoeira teria acabado em pizza. Precisamos não de reclamações vagas, mas de um povo suficientemente politizado para fazer demandas concretas!

Que tal um grande movimento civil organizado, que seja capaz de propor e fazer pressão pela aprovação de um pacote de leis que torne a corrupção (que é um problema que existe em todos os partidos) um crime que seja exemplarmente punido, quando descoberto?

Tanta gente exigindo mais dinheiro pra educação. Mas pouca gente sabe que está pra ser votada, muito provavelmente essa semana, a medida provisória que destina 100% dos royalties do petróleo para educação. E, me desculpem, mas é difícil levar a sério um movimento que não aproveitou a inércia da situação para conseguir apoio para um projeto concreto que pode fazer toda diferença para a educação do Brasil.



Por que ao invés de expressar um rancor vago contra tudo, não fazer campanha por coisas que podem efetivamente fazer alguma diferença? Por que fazer campanha pros gringos não virem pra cá na Copa?! Isso só implicaria em prejuízo, pois (certo ou errado) o dinheiro das obras já foi gasto. Não é melhor agora torcer que o dinheiro que vai entrar compense o que foi gasto?!

É hora de se mobilizar sim. Mas não de uma forma tão vazia de propostas, seguindo uma modinha de se indignar. Indignação pura não leva a nada. O importante é se informar sobre o que está acontecendo, aprender a ler e pesquisar (sem superficialidade) para decidir que causas podem efetivamente fazer alguma diferença e então ir às ruas por elas. Infelizmente, neste momento parece improvável que esse movimento seja capaz de mudar e focar em objetivos concretos. Provavelmente será distorcido e manipulado por diferentes interesses políticos (tanto de Direita, como de Esquerda).

8 comentários:

  1. Temos que começar por algum lugar. Leva-se tempo.
    Mas só pelo fato de vermos as pessoas saírem do seu conforto e se disporem a ir pras ruas (mais de 400mil) pra falar de N coisas diferentes mas pra concordar com pelo menos uma coisa: "tem algo errado com este país" - Isto já é uma grande mudança. Enorme.
    Você pode dizer que isso é óbvio. Você pode dizer que todos já sabíamos. Você pode criticar esta constatação e reduzi-la a uma "expressão vaga de repúdio contra todos os problemas do Brasil"... mas uma coisa aconteceu.
    Apesar de toda essa obviedade, de parecer despropositada ou de parecer vaga, ontem, mais de 400mil pessoas pararam de apenas concordar com isto nos corredores das empresas ou nas conversas de bar e levaram isto a uma grande expressão de insatisfação.
    Você tem razão: precisamos começar a focar este esforço em melhorias. E isto com certeza irá acontecer, sem dúvida. O ponto é: algo precisava acontecer, e aconteceu.
    Ontem você me diria pra não ser ingênuo por achar que isto aconteceria. Hoje você me diz pra não ser ingênuo por achar que isto vai nos levar a algum lugar. Amanhã, espero, quando chegarmos em algum lugar, não haverá mais motivo algum pra não ser ingênuo.

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    1. Você escreveu: "Você tem razão: precisamos começar a focar este esforço em melhorias. E isto com certeza irá acontecer, sem dúvida."
      Mas não deu qualquer motivo para justificar seu otimismo. Se omitiu naquele que é justamente o ponto mais importante da discussão.

      Quanto ao que significa os 400 mil, consideremos CUIDADOSAMENTE o que aconteceu. O Movimento Passe Livre, que é um movimento sério, tinha uma demanda séria a respeito de um problema que eles já haviam estudado cuidadosamente. Sabiam que a demanda era realizável, mas que não havia vontade política pra isso. Concluíram, muito corretamente, que era necessária pressão popular para mudar isso.
      Foram lá, se organizaram, e conseguiram fazer aquela primeira manifestação. Conseguiram um número respeitável, mas não excepcional, de dois mil participantes. A PM de Alckmin, então, reprime violentamente a multidão. Isso foi um tiro no pé, porque acabou dando uma visibilidade ao movimento MUITO maior do que ele jamais teria, principalmente porque vídeos mostrando a covardia da polícia caíram na internet. Aí deu-se o inimaginável, mostrando o poder das redes sociais: a explosão do movimento, que em certos lugares ultrapassou o número de cem mil. Você diz que isso é motivo para comemorar. Pois eu digo que uma massa que se mobiliza mas que se mantém ainda essencialmente ignorante em política, é PIOR do que uma massa alienada em repouso. Pois é mais facilmente manipulável.
      Vou lhe dar um exemplo. Eu ainda não li o suficiente sobre a PEC 37, de forma que não tenho opinião formada a esse respeito. É um assunto complexo, envolvendo interesses políticos fortes, e é preciso saber ponderar exatamente os fatores antes de tomar partido.
      Porém, graças à pseudo-politização, vê-se de repente nas redes sociais e nas próprias manifestações, um monte de gente que há dois dias atrás sequer tinha idéia do que era uma PEC ou da função do ministério público, gritando descontroladamente "Abaixo a PEC37!!" somente pq recebeu no facebook um textinho anti PEC37 tão superficial q não tem linhas suficientes nem pra valer como uma redação do ENEM. Gente dizendo "prisão aos mensaleiros do PT!!" mas não faz a menor idéia de que tb existe um mensalão do PSDB, e jamais se deu ao trabalho de ler as críticas (certas ou erradas) feitas ao julgamento do mensalão, ou a teoria (errada ou não) defendida por muitos jornalistas respeitáveis de que o mensalão nunca passou de um escândalo de caixa 2. Muita gente dizendo "não à copa, queremos hospitais" sem verificar antes os benefícios da Copa, quanto de dinheiro e infra-estrutura entra e etc.
      (continua...)

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    2. (continuação)
      Repare que aqui eu nem quero aqui entrar no mérito dessas e outras teses. O ponto é que as pessoas estão tomando posição a respeito de assuntos sem que tenham pesquisado do assunto o suficiente para isso. Simplesmente vão na onda. Assim, embora pretendam ser apartidários, tornam-se facilmente massa de manobra. Como já está acontecendo, aliás: se vc assistiu Globo News nos últimos dias, vc sem dúvida deve ter percebido como ela tá forçando a barra falando que os manifestantes carregam cartazes contra a PEC 37 ao mesmo tempo que ignora solenemente TODAS as inúmeras bandeiras que apareceram no movimento). E isto está colando. Também é instrutivo observar a influência da mídia sobre essa massa indignada mas politicamente desinformada: muitas referências ao mensalão, mas quase não houve referência às privatizações, que são um escândalo de corrupção ainda maior.

      Não, a verdadeira revolução tem que ser preparada lentamente, com educação (no sentido mais extenso do termo). Só acontece quando a população REALMENTE se torna capaz de avaliar quais são os temas verdadeiramente importantes e se mobilizar por eles. E não uma população que pode facilmente virar massa de manobra, sob influência da mídia ou de boataria espalhada na internet.

      A única coisa que vejo de boa nessa situação toda (além dos aumentos cancelados) é que agora que político virou uma coisa "cool" e essa molecada está tentando falar de política, talvez mesmo quando passar o modismo, esse primeiro contato acabe mostrando a pelo menos uma pequena porcentagem dessas pessoas que política pode ser uma coisa interessante e as leve a explorar o assunto a fundo.

      Abraços!

      Anderson Brasil

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    3. Ok. Eu concordo em todos os pontos... só sou otimista de achar que isto tudo que está acontecendo é bom por um único motivo: as pessoas não se tornam politicamente lúcidas da noite pro dia.
      Isto é um processo, como vc mesmo disse, lento. E sempre foi necessário. Mas ele não viria por ações do governo, com investimento em educação. E nem viria através de um chefe de estado forte e esclarecido, que de repente faria um discurso em rede nacional conscientizando a todos do absurdo com o qual ele tem que lidar durante o tempo todo enquanto arruma a casa.
      Então, só tem um jeito de ver a coisa acontecer: o que está acontecendo agora.
      Agora pode até ser uma massa alienada que acordou sabendo que pode sair gritando sem saber o motivo. Amanhã ela vai saber o motivo, mas com a vantagem de já saber que pode gritar. Uma coisa de cada vez.
      Abraços.

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    4. Discordo quando vc diz que educação do povo não vem do governo. Embora, é claro, tenha que ser mais do que meramente investindo $$$ em educação. Precisamos reformar também a grade escolar, que hoje é demasiadamente cientificista para uma que forme cidadões plenos. Precisamos de uma escola encorajadora do pensamento crítico, que privilegie geografia humana sobre a física, que verdade ensine história (e não decoreba de datas e nomes). Uma escola que reforce os valores da democracia. Acho curioso como os militares foram espertos o suficiente para adaptar o currículo escolar de forma a facilitar sua manutenção do poder (lembra das infames aulas de moral e cívica?) Mas uma vez instalada a democracia, não fizemos o mesmo. Não enfatizamos (e às vezes sequer tocamos no assunto) valores básicos da democracia: Estado Laico, direito civis inalienáveis, papel e importância dos três poderes, a diferença entre democracia e ditadura da maioria. Não comparamos a democracia com outros poderes e ensinamos a eles porque, embora não seja perfeito, a democracia é o melhor de todos os sistemas. Não explicamos o suficiente a necessidade de que todos (absolutamente TODOS) tenham direito à livre-expressão, e o quão ruim é o monopólio da Mídia. Não cultivamos em nossas crianças o hábito de questionar, de modo que elas não sejam manipuladas. Nem hábitos intelectuais saudáveis, não ensinamos a diferença entre argumentos válidos e argumentos [i]ad hominen[/i], e outras falácias de argumentação. Aliás, a habilidade de detectar falhas de argumentação deveria ser um dos objetivos principais na educação de nossas crianças.
      Se há alguma coisa em que o PT falhou, foi não ter a visão de longo prazo pra fazer isso. Seria a reforma de base possível, a revolução silenciosa, MUITO mais fácil do que conseguir a democratização da mídia. Imagina isso implementado há dez anos atrás, junto com o Bolsa Família? Talvez, ao invés de um exército de despolitizados tentando fazer polícia, agora teríamos uma efetiva onda popular por temas que são absolutamente necessários para a democracia, tais como a Reforma Política.

      Abraços!

      Anderson Brasil

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  2. Ok a discussão começou com a falta de "foco" e partiu para o partidarismo. Se esse for o caso, posso afirmar com toda certeza que NENHUMA revolução foi tão uniforme, sólida e arco-íris como a história (versão do vencedor, claro) nos faz acreditar. Mesmo na resistência ao governo mais 666-do-mal-from-hell que tivemos (leia-se ditadura militar de 64)havia grupos dissidentes, extremistas, manipulados, infiltrados e todas essas coisas que os "dois lados" insiste em chamar a gente (beijo, Dilma! Beijão Serra! S2).
    A maioria, no entanto é formada por pessoas "comuns". Pessoas que não se importam quem (o governo é impessoal certo?)esteja no poder, apenas que este está fazendo o trabalho para o qual foi escolhido e que os escutará quando for necessário.
    Saúde, segurança e educação podem parecer motivos vagos demais para para se "pautar" uma revolta (tem como fazer isso?)mas sua falta é presente o suficiente para nos fazer gritar. E quando os gritos nos corredores de hospitais e escolas parecem sussurros, nós vamos às ruas. Não por esse ou por aquele partido, mas pela falta do algo "vago".
    O problema é que nego não ver uma multidão sem querer jogar uma bandeira por cima. Pró ou contra, depende o que for mais útil no momento e muitos caem nessa história simplesmente porque não conseguem se imaginar sem as vantagens [apenas] prometidas pelos seus lideres.
    Um exemplo: Na minha cidade, um partido "vermelho" teve a audácia de levar um TRIO ELÉTRICO para o protesto. A própria multidão os expulsaram. Mais à frente, nossos camaradas da globo tiveram o mesmo tratamento (só mostraram a invasão da câmara)[Se bem que a TV é um puta trio elétrico, mas whateva]. Somos vermelhos? Azuis? Roxos? Rosa com bolinhas?
    O fato de sermos "crianças" e não concordarmos com o modo dos "adultos" fazerem política torna nossa revolta menos justa? É ideia de que não queremos leis cujo único princípio seja o autor ser do partido com maioria na câmara/comissão ("cura gay" lol)? A Revolução Francesa ter começado por causa do preço do pão torna ela menos legítima?
    Seja qual for o rumo que isso tomar (não sou tão burro ao ponto de não perceber as camadas se formando) vou continuar indo às ruas sim e vou continuar zoando com a vida desses velhos idiotas (seja lula, dilma, serra ou aécio). Porque, por mais vaga que seja, essa é nossa única luz no momento.

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    1. ignore alguns erros. Escrevi aos pedaços huehuehue

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    2. LOL, eu escrevi CIDADÕES ali em cima, não sei se vc notou. Não foi só vc q escreveu isso correndo rs.

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